Nona postagem: Secos e molhados - Secos e molhados.
Voltando a escrever sobre um álbum nacional. Cogitei iniciar o texto com um tom de suspense mencionando que esse texto trataria de uma banda que usou máscaras em seu álbum de estréia. Desisti depois de ver que sempre inicio o texto com o nome do álbum - nota zero para o suspense. Então, vamos para um álbum de 1973 (não tem jeito, acabo voltando no tempo) com uma das melhores bandas que andaram pela terra brasilis (não tem itálico aqui).
01. Sangue Latino.
Quando a faixa é uma música famosa parece impossível dar um tom de originalidade. Afinal, Sangue Latino já foi regravada diversas vezes (gosto da versão do Nenhum de Nós) e já se escreveu tudo que se poderia escrever sobre ela. Sendo assim, escreverei o que me chama a atenção na faixa. São duas coisas:
a. A calmaria da música em contraste com a força da letra, e;
b. A brincadeira com as palavras (peguei a lança, lancei no espaço, por exemplo). Faixa para se ouvir em qualquer momento do dia e em qualquer clima;
02. O Vira.
Mistura de rock com música portuguesa. Tanto se ouve falar sobre vira homem e vira lobisomem quando fala-se sobre Ney Matogrosso e tudo inicia nessa faixa. Música engraçada e que mistura elementos do folclore e místicos como em uma grande festa. Destaco a guitarra pra dar um clima pesado, apesar da distorção, na divertida faixa;
03. O patrão nosso de cada dia.
Aqui temos um poema. Gosto da parte de estar preso à sua senha. Algo bem atual nesse mundo onde os patrões conhecem seus funcionários por números. Detalhe para o sino. Sino referindo-se ao horário de trabalho e também à igreja. Detalhe simples e elegante da faixa;
04. Amor.
Essa é pra reconhecer os anos setenta nos primeiros cinco segundos de audição. Contra baixo dançante iniciando uma faixa que fala sobre...coisas suaves. Aliás, suave coisa nenhuma. Olha a nuvem azul;
05. Primavera nos dentes.
Chegamos à maior faixa do álbum. Momento pra comentar que ele dura apenas meia hora. Outro ponto importante a ser comentado é que aqui não temos narrativas ao longo do álbum, como em vários que comentei aqui. Esse tem letras fechadas. O assunto nasce, desenvolve-se e morre no tempo da faixa. Aqui, temos um instrumental voltando para o blues (bom e velho blues) antes de uma bela faixa sobre a liberdade, a consciência para lutar contra tantas coisas absurdas que vemos diariamente. Faixa rock and roll do álbum;
06. Assim assado.
Esse título é retomado em 2003, em uma homenagem feita ao grupo, onde várias músicas são regravadas por artistas atuais (naquele momento). Aqui temos um som psicodélico que faria o Led Zeppelin pensar que copiaram o Secos e Molhados (sem exageros);
07. Mulher barriguda.
Prepara o bolsa família... O contexto do álbum é período de guerra (estamos com a guerra do Vietnã em ação) e a música toca nesse tema. Adiante, outra faixa falará sobre a guerra, outra guerra;
08. El rey.
Aula de História. Não durmam. Violões mostram influência portuguesa. E a música trata sobre isso. Período de D. Manuel como Rei de Portugal. A música vai tratar da queda do rei e também de suas tentativas de se manter no poder. Verifique a letra em sua organização e veja como tem nuances bonitas. Exemplo: Ela é dividida em quartetos (lembra das aulas de Literatura? quando o texto é dividido em 4 "frases") mas em um dos versos temos um terceto pois a palavra "morte" encerra o que seria o quarto verso. Genial;
09. Rosa de Hiroshima.
Dentro de um álbum que fala sobre as guerras e seus horrores, assim como, cita que devemos lutar pelos nossos direitos e contra injustiças (hum... e não é que o álbum tem uma história pra contar?), não poderia faltar o poema de Vinícius de Moraes (crianças que não o conhecem, vão estudar!!). O que falar sobre essa faixa? Bom, é a primeira gravação dela então, bebam da fonte e não do garrafão. Chamaria atenção para a descrição do que acontece com as vidas das pessoas após o bombardeio das cidades de Hiroshima e Nagasaki;
10. Prece cósmica.
Dentro desse contexto de guerras, um pedido pela paz. De forma nada sucinta, sendo direto. Que o vinho quente faça não as bombas mas as pombas aparecerem. Gosto dessas brincadeiras. Vinho quente do coração, bombas e pombas (genial essa pois bombas caem enquanto pombas sobem);
11. Rondó do capitão.
Vou ajudar. Palavra de origem francesa (rondeau) que significa poema fixo, com oito ou dez versos, sempre uma quintilha e um terceto, com rimas (Juro que depois que escrevo uma coisa dessas fico pensando como é que toca funk nesse mundo). Seguindo... Essa é muito bacana. Parece uma ciranda. Ainda com a temática da guerra;
12. As andorinhas.
Metal? Quase. Faixa que me parece um interlúdio (já escrevi sobre isso). Dentro da ditadura, os fios tensos da pauta de metal (ditadura mesmo) as andorinhas gritam por falta de uma clave de sol (perfeita a junção de música e o sol simbolizando a liberdade). Genial (sei que já coloquei isso em outra faixa mas não tem outra forma);
13. Fala
Acabou o álbum. Meia hora é pouco tempo. Uma chave de ouro para fechar. Espero que todos tenham entendido esse álbum. E espero que todos ouçam pois eu o escutei com carinho para poder falar sobre.
Resumo da obra: Sempre é bom escrever sobre música brasileira. Infelizmente para se falar sobre a boa música, a máquina do tempo precisa entrar em ação. Esse é um dos dois álbuns dessa banda fantástica que foi um meteoro. Brilhou e encerrou rapidamente. Sugestão: Tem uma compilação feita pelo Charles Gavin (Titãs) que traz os dois álbuns em um CD só. Essa é a versão que tenho. Esse álbum entra em uma lista do tipo "rápido mas eficaz". Semana que vem, décima postagem e com álbum definido... surpresa.